ENTRE CHEGADAS E PARTIDAS: TRÊS DÉCADAS NA RODOVIÁRIA DE PINHALZINHO

Ronaldo e Fabiane

 

            Ninguém conhece tão bem a trajetória e a realidade da Rodoviária de Pinhalzinho quanto Ronaldo Adriano Santos. Dos seus 44 anos de vida, os últimos 32 têm sido passados entre os ônibus, passageiros e mercadorias que diariamente circulam pela estação do município de pouco mais de 20 mil habitantes, localizado no oeste catarinense. Com apenas 12 anos de idade começou a trabalhar como faxineiro do banheiro da antiga estação, localizada no Centro da cidade. Com o passar do tempo e o bom desempenho, foi angariando mais funções e responsabilidades até que, há 17 anos atrás, se tornou proprietário do estabelecimento – hoje sediado às margens da BR-282 – função que atualmente desempenha em conjunto com a esposa, Fabiane Dessoy Santos e mais um pequeno grupo de sócios.

            “Até o nosso relacionamento começou aqui dentro da Rodoviária”, diz Ronaldo, apontando para a esposa. “Na época ele estava trabalhando, eu vim comprar uma passagem e acabamos discutindo”, complementa Fabiane, “Mas depois começamos a namorar”.

            Atualmente, o casal vê com preocupação a situação do ramo de transportes coletivos. “Nos últimos dez anos, o número de passageiros tem diminuído em média 35% ao ano”, explica Ronaldo, “Com isso as empresas têm cancelado linhas e diminuído as opções de horários, para evitar os prejuízos”. O contexto, que já era difícil para o setor, piorou drasticamente com a chegada da pandemia de COVID-19 e desde então não melhorou mais. “Hoje a maior parte dos passageiros e formada por idosos”, diz Fabiane, lembrando que esta faixa etária possui gratuidade e/ou desconto no valor da passagem, assim como jovens “de baixa renda” e pessoas com deficiências físicas.

            Quando questionado sobre os motivos que têm ocasionado essa queda no movimento, o casal aponta um conjunto de fatores. Talvez o principal seja a concorrência com empresas “paralelas” que não utilizam a estrutura da rodoviária e também fazem transporte de passageiros entre municípios diversos. “As pessoas esperam esses ônibus na rua, sem conforto nenhum, mas quando precisam vir à rodoviária reclamam de tudo”, diz Fabiane, complementando que lidar com a grosseria e a falta de educação de alguns clientes tem sido um dos pontos negativos da atividade. Também é lembrado o fato de que atualmente mais pessoas têm carro próprio do que no passado, de tal forma que muitos preferem viajar em seus próprios veículos. Entre os frequentadores da rodoviária, ainda há aqueles que apenas embarcam no terminal, mas compram as passagens online, o que não gera lucro para quem possui a concessão. “E ainda quando compram a passagem errada na internet, vêm aqui e reclamam com a gente, como se nós tivéssemos culpa”, comenta Ronaldo.

            Algumas críticas, que consideram infundadas, também aborrecem. “Já teve gente dizendo que a rodoviária está abandonada, só porque estamos trabalhando em horário reduzido, mas veja um dia como hoje [sábado], que só tem um ônibus no início da manhã e outro no início da noite, o que vamos ficar fazendo aqui no restante das horas?”, questiona o proprietário.

            A constante diminuição no fluxo de passageiros afetou até a lanchonete que funcionava no interior do prédio e que já se encontra fechada há sete anos. “Ninguém quer assumir por causa da falta de clientela”, diz Ronaldo.

            Sobre o que esperar do futuro da rodoviária, o casal não se mostra otimista. “Se dependesse apenas da minha vontade, já teria abandonado”, desabafa Ronaldo, “Hoje em dia não está mais sendo viável”, complementa Fabiane. Ambos deixam claro que quando terminar o contrato de concessão junto à Prefeitura – em meados de 2024 – é possível que desistam de continuar com o empreendimento.

            Apesar do momento atual, repleto de incertezas, para quem passou as últimas três décadas em meio ao vai e vem de inúmeros passageiros, o que não faltam são vívidas memórias de fatos engraçados, impressionantes ou simplesmente bizarros. “No passado, quando os ônibus não eram climatizados, por mais de uma vez eu presenciei pessoas colocando a cabeça para fora da janela para vomitar e, no meio disso, despachar a dentadura junto”, conta Ronaldo. Passageiros bêbados também já renderam muitas histórias. “Teve um que fez escândalo, brigou, começou a quebrar tudo porque sua passagem havia sumido, e depois se descobriu que o bilhete estava o tempo todo no bolso dele”, emenda. “Também já teve muitos relacionamentos que começaram e outros que terminaram aqui nos bancos da rodoviária”, acrescenta Fabiane, dizendo ainda que volta e meia aparecem maridos desesperados por lá, à procura de esposas que fugiram de casa. “Mas a lei não permite que a gente repasse informações dos passageiros a terceiros, então eles vão embora desanimados, ou nos xingando”, diz ela.

            Espaço de encontros e despedidas, a Rodoviária de Pinhalzinho hoje corre o risco de se tornar apenas mais um local de lembranças, uma referência na memória daqueles que chegaram ou que partiram através de seu terminal. “Acredito que em breve não vai ter mais nada aqui”, afirma Ronaldo, “Vai fechar, assim como muitas rodoviárias de outros municípios estão fechando”.

            Área de fluxo entre os que vêm e os que vão, talvez esteja mesmo perto o dia em que todos terão que ir e que ninguém mais irá chegar. Porém, mesmo que as piores previsões se confirmem, o proprietário deixa claro que o legado dos pontos positivos ficará consigo. “Sempre amei esse trabalho”, diz ele, “E fiz muitas amizades aqui. Essas sempre irão permanecer”.

 

André Bozzetto Junior 

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Comentários

  1. Obrigado pela oportunidade, não foram críticas apenas desabafo, e a realidade de muitos terminais que ainda sofrem muito mais

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  2. A realidade de todas as rodoviárias de hoje em dia. Infelizmente

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  3. Verdade o que ele falou .eu ia 2 vezes por ano visitar minha mana .saia de Arroio di meio ate pinhalzinho sc.na rodoviaria la eu espera outro onibus ou carona ate chuvencio.depois da bandemia acabou tudo

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