A NOITE DAS "BICHAS" NA CÂMARA DE VEREADORES DE PINHALZINHO

 

        Discussões acerca da sexualidade humana parecem ser tão antigas quanto a própria Civilização. Tendo o heterossexualismo se estabelecido majoritariamente como a convenção padrão ao longo do tempo, debater a homoafetividade e as questões de gênero tem sido um permanente desafio, invariavelmente pautado por polêmicas. Em tempos atuais, onde o extremismo, o fundamentalismo e a intolerância vieram à tona de forma sistemática – acompanhados da desinformação e da difusão de fake news – colocar o tema em foco continua sendo não apenas necessário, mas também urgente.

            Essa proposta pautou a 17ª edição da Primavera dos Museus, iniciativa de abrangência nacional promovida pelo IBRAM – Instituto Brasileiro de Museus, que neste ano de 2023 chegou com o tema “Memórias e Democracia: pessoas LGBT+, indígenas e quilombolas”, que também contou com programação local desenvolvida através do Museu Histórico de Pinhalzinho.

            Como parte desta programação, ocorreu na noite de 22 de setembro na Câmara Municipal de Vereadores o Cine Debate, pautado na exibição e discussão do documentário “Bichas”, lançado em 2016 com direção do pernambucano Marlon Parente, que aborda os relatos de seis jovens gays acerca da autoaceitação do homossexualismo e da ressignificação do termo “bicha”, que de algo pejorativo pode se converter em expressão de empoderamento. O média-metragem surgiu como resposta a uma ameaça de morte que o diretor sofreu após ser identificado na rua como gay, por estar andando de mãos dadas com outro homem.

            A mediação do debate contou com a presença da professora e integrante da UNA LGBT, Janaína Trevisan, do professor de Sociologia, Keller Bresolin e do cineasta Vagner Bozzetto, da BSK Filmes.

            Os apontamentos feitos pelos mediadores acerca de tópicos expostos no filme e sua correlação com a realidade observada se revelaram bastante pertinentes para instigar a reflexão e também a participação do público presente que – apesar de pequeno – não se furtou em contribuir com o debate através de relatos e opiniões, sempre em alto nível e total respeito pelas considerações alheias, tal como deve ocorrer ao se abordar não apenas temas dessa magnitude, mas em qualquer discussão civilizada, pautada em argumentos ao invés de meros “achismos”.

            Um ponto central posto em foco foi a necessidade de “sair do armário”, a postura por parte das pessoas homossexuais de assumir a sua condição, não somente em busca da autoafirmação e da aceitação social, mas também como forma de expressar apoio a outras pessoas que vivenciam circunstâncias similares.

            As dificuldades no diálogo e na aceitação familiar, o preconceito, a discriminação, o bullying, as agressões e até mesmo os assassinatos (o Brasil está há 14 anos em 1º lugar no ranking mundial deste tipo de crime) vieram à tona, evidenciando a urgência em se buscar formas – em todas as esferas sociais – de se chegar a um convívio mais harmônico, baseado no respeito à diversidade e à liberdade alheia, que é não somente uma questão de bom-senso, mas um direito constitucional de todo cidadão.

            A realidade local também foi colocada em pauta pelo público presente, onde pareceu haver um consenso de que no Município há uma parcela muito grande da sociedade que mantém uma postura excessivamente conservadora, que pende para o preconceito e à intolerância. Foi mencionado que o simples fato de o evento ser realizado na Câmara de Vereadores – um espaço que tem obrigação de manter as portas abertas para todos os estratos sociais – gerou polêmicas e reclamações por parte de diversos indivíduos que consideram que o lugar não é apropriado para receber “esse tipo de gente”.

            Ao que consta, este foi o único fator “negativo” (assim mesmo, entre aspas) apontado no evento: a ausência destes que polemizam e reclamam nos bastidores, mas não se dignam a buscar mais conhecimento sobre o tema, muito menos a dar a cara à tapa participando de um debate aberto.

            Independente de classificações, rótulos ou estigmas, o que precisa ficar evidente é que este tipo de discussão é, em primeiro lugar, sobre seres humanos. Por isso não deve nunca sair de pauta, seja na primavera – dos museus ou de outros eventos – ou em qualquer das estações.

 

André Bozzetto Junior

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NOTA: a última foto é de autoria do Grupo A Sua Voz de Comunicação. 

Comentários

  1. Bela e urgente reflexão!
    Muito obrigado, André!

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  2. Parabéns por abordar este assunto. Respeito em primeiro lugar.

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