PARA QUEM BATALHA NO UNDERGROUND, O ROCK NUNCA MORRE

 

Diego Soares

                No Brasil, o rock está fora do mainstream há tempos. Com exceção dos grandes eventos, que trazem aos palcos bandas consagradas do exterior, é muito raro vermos o gênero ganhando destaque na TV, nas rádios ou mesmo nos grandes canais midiáticos da internet. Quando se trata de bandas nacionais então, parece que o desinteresse de quem controla os holofotes é ainda maior. Não que isso seja uma novidade. Em um país como o nosso, fortemente enredado pela indústria cultural, onde os interesses financeiros falam mais alto do que a voz dos artistas, apenas de tempos em tempos o rock consegue arrombar algumas brechas para obter a visibilidade do grande público. Quando a fase passa e o gênero maldito é novamente empurrado para as sombras pelos magnatas que ditam a moda, logo alguém traz à tona o manjado bordão: “O rock morreu”.

            Só que não. Mesmo ausente dos grandes veículos de comunicação, no underground o rock sempre esteve vivo, firme e forte. É isso que testemunha o eletricista automotivo Diego Pereira Soares, 36 anos, que desde o início da década de 2000 vem labutando com diversas bandas pelos mais diversos recantos da noite cearense.

            Natural de Fortaleza e atual residente de Caucaia, Diego toca bateria nas bandas Head Night e Crápulas, além de atuar como baixista e vocalista da Invocados. “A meu ver o rock não está morto e não vai morrer tão cedo”, diz ele, “É um estilo peculiar, singular, um estilo de vida, para quem gosta de verdade”. E desta visão, do rock como sendo mais do que um simples gênero musical, que vem a força que o faz sobreviver a todos os modismos, aos desmandos do mercado e ao descaso de muitos que poderiam prestar apoio. Para quem conhece de verdade, o rock sempre foi sinônimo não apenas de rebeldia, mas também de liberdade, não apenas de controvérsia, mas também de resistência. Esses são os instrumentos pelos quais o estilo musical se converte em estilo de vida. “O rock é um sonho, um projeto, uma válvula de escape da rotina”, afirma Diego, “É prazeroso, desafiador, traz aquela sensação de adrenalina”.

            Como todo “rockeiro” que se preze, ele nunca deixou que as dificuldades o impedissem de viver o sonho à sua maneira. Por falta de dinheiro, quando era garoto se viu obrigado a improvisar baterias com baldes, galões e outros objetos de metal, mas sempre com a certeza de que no momento oportuno teria sua banda de verdade. “No início dos anos 2000 já reunia uma galera para beber e tirar um som na casa de alguém ou em algum quintal”, explica Diego, acrescentando que a primeira apresentação de verdade chegou em 2010. Assim vem à baila outra faceta fundamental inerente ao rock: a de elemento formador de identidades, agregador e promotor de sociabilidades. Os percalços não são suficientes para se sobrepor a essa lógica. “Vale a pena topar esse desafio, de compor, formar uma banda, pegar a estrada, conhecer pessoas e lugares, produzir, confrontar, passar sua mensagem, escrever seu capítulo nessa história”, afirma o músico.


            Questionado sobre como vê o panorama do rock do seu Estado na atualidade, Diego põe os aspectos positivos acima de eventuais pontos negativos. “O cenário cearense é diverso, bonito, amplo, mas tem suas particularidades, e seu lado sombrio”, analisa, “Há projetos, iniciativas e coletivos atuantes e honestos, mas têm aqueles que querem se apropriar do mesmo e até ditar regras por serem ‘os dinossauros do underground’, mas vale a pena comprar a briga e deixar seu legado”, pondera.

            E a parte financeira? “Como banda autoral dificilmente você consegue um retorno financeiro”, diz Diego, quando o assunto entra em pauta, “Geralmente as bandas cover ganhar algum cachê por suas apresentações, mas os autorais precisam tentar editais com órgãos públicos para tais fins”, explica, confirmando uma realidade testemunhada também por músicos de outros Estados, onde, ironicamente, parece haver maior interesse dos contratantes em bandas que tocam músicas de outros artistas consagrados do que nas que investem em seu próprio repertório. “Mas, para mim compensa o esforço de ter seu trabalho, de compor, de produzir algo seu e não se prender somente aos covers”, afirma Diego.

            Acostumado a tocar nos mais variados redutos, o músico destaca a diversidade do público que frequenta esses locais, pondo em foco mais uma vez o papel do rock enquanto propiciador de convivências, encontro de gerações e agregador de culturas. “Têm pessoas conhecidas e desconhecidas, amantes de rock autoral e covers, produtores locais, e uma mescla da velha e nova geração”, cita Diego, “Mas sempre tem músicos e membros de outras bandas”. Ele acrescenta ainda a noção de que o underground deve ser vivenciado de fato. “Se você quiser saber o que está rolando no cenário nacional, de seu Estado e de sua cidade, precisa tirar a bunda da cadeira e dar uma volta para ver o que está acontecendo, conhecer as bandas, os espaços, os eventos e o trabalho dos produtores locais”.

             Dentro desta perspectiva, Diego deixa um conselho para quem compartilha o sonho de experienciar o underground através da aventura de integrar uma banda: “Siga seus instintos, sua intuição, sua paixão, e não abra mão de seus sonhos e objetivos”, recomenda, acrescentando, “Faça o que gosta, estude, aprenda, mergulhe nesse mundo, e faça de bom grado, sem visar lucros e sem desanimar. Não desista com as porradas da vida e os obstáculos que vão surgir pelo caminho. Vai valer à pena pelas pessoas que vai conhecer, os lugares, e a oportunidade de pegar a estrada e descobrir o que existe no horizonte”.


André Bozzetto Junior

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Comentários

  1. Aqui na sertanejolândia do Oeste Catarinense o pouco de rock que existe é restrito aos covers. Acho que já deu de ficar eternamente ouvindo os mesmos covers de sempre. Temos que incentivar a gurizada nova a pegar nas guitarras e fazer arte.

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